
Portabilidade de Carências do Plano de Saúde

Autor: Rodrigo Araújo
Data: Fevereiro/2016
Devido ao encerramento de atividades da Unimed Paulistana, o termo “portabilidade” passou a frequentar o noticiário como nunca antes. Saiba o que é, para que serve, se vale a pena e como exercer esse direito.
Por Rodrigo Araújo
O que é Portabilidade de Carências?
A portabilidade dos planos de saúde ou, mais precisamente, a portabilidade de carências já cumpridas pelo consumidor, de um plano de saúde para outro, surgiu em abril de 2009, através da Resolução Normativa n. 186, da Agência Nacional de Saúde Suplementar, a ANS.
Através da portabilidade, o usuário de um plano de saúde que preencher os requisitos legais, pode contratar o plano de saúde de outra operadora e não ter que cumprir novos prazos de carência.
Prazos de carência, por sua vez, são os períodos estabelecidos pela Lei n. 9.656/98 em que o novo contratante não poderá fazer uso de alguns serviços contratados perante a empresa de planos de saúde, destacando-se, dentre esses períodos, o prazo para carência de tratamento de doenças preexistentes, que é de 24 meses após a contratação.
Assim, o consumidor que era portador de uma determinada patologia antes de aderir a um plano de saúde, somente terá cobertura para o tratamento dessa patologia após cumprir 24 meses de contrato, caso a operadora de saúde não estipule um prazo menor ou caso o consumidor não tenha feito uso da portabilidade de carências.
Quais são os requisitos legais e quem pode se beneficiar dessa portabilidade?
Quando a portabilidade foi implantada pela ANS, em 2009, ela somente beneficiava os consumidores de planos de saúde do tipo individual e/ou familiar, com contratos assinados a partir de 1999 ou que tivessem sido adaptados à Lei n. 9.656/98.
Além disso, o consumidor precisava estar adimplente com o pagamento das mensalidades na operadora de saúde de origem e ter prazo de permanência mínimo de 02 anos no plano de saúde do qual desejava portar.
A portabilidade só poderia ser exercida para planos de saúde do tipo individual e/ou familiar de outras operadoras que tivessem a mesma faixa de preço e esse direito poderia ser exercido somente no mês de aniversário do contrato e no mês subsequente ao aniversário.
Com o passar dos anos, esse suposto benefício se tornou inócuo, pois a maioria das operadoras de saúde deixou de comercializar planos de saúde do tipo individual.
A ANS, então, foi compelida a alterar essas regras e expandir o direito de portabilidade para os usuários de planos coletivos por adesão, que são os contratos oferecidos por sindicatos e associações de classes profissionais para seus afiliados.
Assim, a partir de 2011, a portabilidade passou a ser exercida por usuários de planos individuais e planos coletivos por adesão, excluindo, apenas, os beneficiários de contratos coletivos empresariais (disponibilizados aos sócios ou empregados da empresa contratante do plano de saúde).
As regras atualmente vigentes permitem a portabilidade de carências desde que o consumidor cumpra os requisitos legais, cujos principais estão abaixo relacionados:
1. seja beneficiário de contrato de plano de saúde individual ou coletivo por adesão;
2. esteja adimplente com o pagamento das mensalidades perante a operadora de origem;
3. tenha, no mínimo, dois anos de permanência no plano de saúde de origem quando se tratar de primeira portabilidade e, no mínimo, um ano de permanência quando se tratar de portabilidades posteriores;
4. escolha plano de destino do tipo individual ou coletivo por adesão;
5. escolha a segmentação do plano de destino compatível com a segmentação do plano de origem, nos termos do Anexo da Resolução Normativa n. 186 da ANS, alterada pela RN n. 252¹;
6. tenha faixa de preço compatível;
7. seja a portabilidade requerida entre o mês de aniversário do contrato e os 3 meses subsequentes;
8. na hipótese de o consumidor optar por um plano coletivo por adesão como plano de destino, ele deverá preencher os requisitos de admissibilidade para adesão ao contrato coletivo por adesão (pertencer ou ter vínculo com a associação, sindicato ou entidade de classe contratante do plano de saúde coletivo).
Tenho direito. Como devo fazer para portar minhas carências para outro plano?
Na prática, o consumidor precisa ter conhecimento apenas dos requisitos elencados nos itens 1, 2, 3, 7 e 8, acima.
Preenchidos esses requisitos, o consumidor deverá acessar o site da ANS www.ans.gov.br, procurar por “Espaço do Consumidor” e depois por “Faça portabilidade”. O usuário será direcionado para o Guia de Planos ANS, no endereço www.ans.gov.br/guiadeplanos/. Ali, deverá clicar na segunda opção “Portabilidade” e, em seguida, em “entrar”.
Na tela seguinte, será necessário preencher o número de registro da operadora de saúde, o número de registro do plano, Estado e Município.
Na própria página, há instruções para o consumidor obter o número de registro de sua operadora e plano de saúde, caso ele não tenha essas informações.
Diversos filtros de pesquisa são oferecidos para facilitar a busca por planos de saúde compatíveis. Ainda assim, a pesquisa não é de fácil compreensão para parte dos usuários de planos de saúde. Na dúvida, o usuário deverá contatar um corretor de planos de saúde.
A título de exemplo, consideramos um consumidor que busca por um plano de saúde em São Paulo/SP, sem optar por operadora de saúde específica, com abrangência nacional, cobertura hospitalar e ambulatorial, com acomodação individual, sem fator moderador, sem definição do tipo de contratação e nas faixas de preço 3 e 4 (de 5 disponíveis).
Conforme o resultado da pesquisa, o consumidor poderá alterar os filtros de busca para ampliar ou reduzir o número de opções de planos de destino.
Para as opções de contratação de planos coletivos por adesão, o interessado deverá ter vínculo com a associação ou entidade de classe contratante do plano de saúde.
Vale a pena fazer a portabilidade de carências?
Sim. Por muito tempo, a portabilidade de carências foi bastante subutilizada pelos consumidores.
Isso aconteceu porque o mercado dispunha de mais opções de contratação e, na maioria das vezes, o consumidor conseguia bons produtos no mercado, sem precisar exercer a portabilidade de carências, que é um procedimento burocrático e moroso.
Atualmente, as operadoras de saúde têm conseguido, com o apoio da ANS, selecionar de forma mais efetiva o consumidor que mais lhe interessa.
Não é por outro motivo que idosos e portadores de graves doenças têm tido cada vez mais dificuldade em contratar novos planos de saúde.
Diante desse cenário, a portabilidade de carências passou a ser uma importante ferramenta na mão do consumidor.
Questões controvertidas referentes à portabilidade:
Portabilidade para beneficiários de contratos coletivos empresariais
Os beneficiários de planos de saúde coletivos empresariais não têm direito a portabilidade.
A portabilidade não faz sentido para esses consumidores quando observadas as regras existentes para os demais tipos de contrato.
No entanto, considerando que esses beneficiários respondem por 60% do total de usuários de planos de saúde no país e que, muitos deles não terão direito de manutenção do plano de saúde após o término do vínculo de emprego (leia mais em https://rodrigoaraujoadvogado.com.br/artigos/direito-a-manutencao-do-plano-de-saude-para-aposentados-e-demitidos/), é importante que a ANS conceda aos empregados beneficiários de planos de saúde empresariais o direito à portabilidade de carências após o término do vínculo de emprego.
Esses consumidores deixaram de pagar por um plano de saúde próprio porque tinham cobertura através do plano de saúde da empregadora.
Ainda que a empregadora custeasse a totalidade do valor do plano de saúde, não se pode deixar de considerar que esse custo, em última análise, sai do bolso do empregado, pois o plano de saúde complementa o salário e, portanto, faz parte da remuneração.
Logo, não pode ser admitido que o empregado que pagou por um plano de saúde, ainda que indiretamente, tenha que cumprir novos prazos de carência após o rompimento do contrato de trabalho ou após o término do período de extensão do benefício do plano de saúde pós rescisão do contrato de trabalho.
Portanto, deve a ANS ampliar as regras de portabilidade para abranger os beneficiários de planos de saúde coletivos empresariais após o término do vínculo de emprego.
Já para os ex-empregados com direito à manutenção do plano de saúde após a rescisão do contrato de trabalho, é permitida a portabilidade especial de carências para planos individuais ou coletivos por adesão, conforme previsto no artigo 7º-C, da RN n. 186/2009 (alterada pela RN 279/2011), da ANS.
Rescisão unilateral de contratos coletivos
Qualquer contrato coletivo, seja ele empresarial ou por adesão, pode ser rescindido unilateralmente pela operadora de saúde após o prazo de 12 meses, desde que ela rescinda todo o contrato e notifique a empresa contratante com antecedência de 60 dias.
Em dezembro de 2015, a Omint Serviços de Saúde, rescindiu, unilateralmente, todos os seus contratos coletivos por adesão.
Por se tratarem de contratos coletivos por adesão, os beneficiários com mais de dois anos de contratação para casos de primeira portabilidade ou com mais de um ano para quem já havia exercido portabilidade anteriormente, teriam direito a portar suas carências para outras operadoras.
Ocorre que, pelas regras atuais, a portabilidade somente pode ser exercida no mês de aniversário do contrato e nos 3 meses subsequentes.
Logo, quem não se encontrava nesse período de portabilidade, não pode exercer esse direito e teve que buscar por outros planos de saúde e cumprir novos prazos de carência.
A Qualicorp Administradora de Benefícios, responsável pela administração desse contrato, ofereceu aos clientes da Omint a possibilidade de aderir ao plano de saúde da Sul América Cia. de Seguros, sem imposição de novos prazos de carência, exceto para consumidores com doença preexistente.
Dessa forma, um beneficiário do plano de saúde rescindido pela Omint, que fosse portador de uma grave doença, como câncer, somente foi admitido no contrato da Sul América mediante o cumprimento de 24 meses de carência para o tratamento da doença preexistente.
Cabe à ANS, portanto, prever essa situação e permitir que, em hipóteses como tais, tenha o consumidor o direito à portabilidade para outro contrato.
Qual a diferença entre Portabilidade, Portabilidade Especial e Portabilidade Extraordinária?
Até este ponto, foi abordada apenas a portabilidade regular, mas existem outros tipos de portabilidade que não seguem a regra geral. São elas a portabilidade especial e a portabilidade extraordinária.
Até mesmo a ANS costuma confundir o termo e chamar de extraordinária situações de portabilidade especial e chamar de especial situações de portabilidade extraordinária.
A portabilidade especial também é regulamentada pela RN n. 186.
Na hipótese de a ANS cancelar o registro ou determinar a liquidação extrajudicial de uma operadora de saúde, é aberto o prazo para a transferência compulsória da carteira de clientes dessa operadora.
Para que a transferência compulsória seja bem-sucedida, uma outra operadora tem que manifestar interesse em assumir essa carteira de clientes.
Se isso não acontecer no prazo de 60 dias, a ANS poderá instaurar o regime de portabilidade especial, que permite que todos os beneficiários da operadora de saúde que teve o registro cancelado ou que entrou em liquidação extrajudicial possam portar suas carências para outros planos de saúde, do tipo individual ou coletivo por adesão.
Assim, até mesmo os titulares de contratos empresariais podem exercer a portabilidade.
Também não há exigência de cumprimento de prazos de permanência no plano de saúde de origem.
A portabilidade extraordinária, por sua vez, somente é permitida se for demonstrado efetivo interesse público, conforme destaca o parágrafo 7º do artigo 7º-A, da RN n. 186.
Não existem regras definidas para a portabilidade extraordinária. Tal como o próprio nome indica, trata-se de situação extraordinária, podendo a ANS estabelecer critérios de acordo com a necessidade de cada caso.
Como mencionado acima, a portabilidade extraordinária somente se justifica em casos de efetivo interesse público.
A ANS, infelizmente, faz uso desse recurso sem a demonstração efetiva de interesse público, prejudicando, muitas vezes, os consumidores desse serviço.
Foi assim no caso da Unimed Paulistana, operadora que possuía 744 mil beneficiários na ocasião em que a ANS determinou a venda compulsória da carteira de clientes.
Findo o prazo mínimo de 30 dias exigido pela lei para que outra operadora manifestasse interesse em adquirir essa carteira de clientes, a ANS instaurou, de imediato, a portabilidade extraordinária, que foi oferecida apenas a dois segmentos de clientes da Unimed Paulistana (individuais e empresariais com até 29 vidas) e com opção de migração apenas para contratos de outras poucas empresas que também utilizavam a bandeira Unimed e que ofereceram planos muito inferiores em rede credenciada e com preços maiores do que àqueles que eram cobrados pela Unimed Paulistana.
O interesse público é aquele que objetiva o bem geral da sociedade.
Nesse caso, ele não foi demonstrado. Na verdade, ele foi utilizado como moeda de troca.
Os clientes da Unimed Paulistana estavam sem a cobertura do serviço contratado e assim ficariam até o término do processo de migração da carteira.
A ANS, então, ofereceu uma solução um pouco mais rápida, aproveitando-se da situação precária dos consumidores, mas que oferecia benefícios MUITO INFERIORES ao da portabilidade especial.
¹De segmentação ambulatorial para ambulatorial; de internação sem obstetrícia para internação sem obstetrícia ou para plano somente ambulatorial; de internação com obstetrícia para internação com obstetrícia ou internação sem obstetrícia ou somente ambulatorial.



















