
A Era do Diálogo

Revista do Consumidor Moderno – Março/2016, pg 94/96
Na edição de março da Revista do Consumidor Moderno, o Dr. Rodrigo Araújo, sócio da Araújo, Conforti e Jonhsson – Advogados Associados, foi entrevistado e falou sobre os direitos dos consumidores de planos de saúde.
Fonte: Revista do Consumidor Moderno – Março/2016, pg 94/96
Os motivos são velhos conhecidos. Negações de cobertura, descredenciamentos de clínicas, hospitais e médicos e os costumeiros reajustes e as cobranças abusivas ocupam o topo da lista de queixas e também de ações nos tribunais. Segundo a Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde), a entidade patronal do setor, pouco mais 390 mil ações tramitaram no Judiciário até junho de 2014 – o número inclui as saúdes públicas.
No entanto, os últimos meses apresentaram alguns fatos novos, como o surpreendente fechamento da Unimed Paulistana e que deixou descobertos 744 mil pessoas. O resultado reforçou uma suspeita do setor: há uma tendência de evasão dos planos e, ao mesmo tempo, o avanço das clínicas populares.
MENOS BENEFICIÁRIOS
O caso Unimed Paulistana é o resumo dos novos problemas do setor de planos de saúde. Embora a má gestão do negócio fosse apontada como o principal fator para o fechamento da operadora, é inegável que a crise econômica e os seus reflexos expuseram a sangria financeira conhecida desde 2009 – um problema conhecido pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS).
“Há também o caso Unimed Rio. Em 2013, a empresa foi autorizada pela ANS a assumir a carteira de beneficiados da Golden Cross. Do total de beneficiados da antiga empresa, 160 mil beneficiários eram de São Paulo e a Unimed Rio não atendia no Estado. A Unimed Paulistana, então passou a prestar o serviço em São Paulo, mas daí ela fechou. No fim, não havia rede credenciada e surgiram muitas reclamações. Penso que a Unimed utiliza uma marca como se fosse uma única empresa, o que não é verdade”, afirma Rodrigo Araújo, advogado, especialista em planos de saúde e sócio da Araújo, Conforti e Jonhsson advogados associados. O escritório fez um estudo sobre as principais reclamações dos últimos dez anos e o resultado está disponível no site da Consumidor Moderno.
O fim da Unimed Paulistana deixou centenas de milhares de pessoas, que logo foram absorvidas por outras operadoras de saúde. Mas não todo mundo. Houve evasão de beneficiados, o que também afligiu outras empresas. Segundo dados da ANS, havia 50,496 milhões de beneficiários em dezembro daquele ano. A partir daí os números de adeptos oscilaram até caírem no meio do ano passado. Em dezembro, o número de beneficiários foi de 49,730 milhões, ou seja, 766 mil pessoas a menos nos planos de saúde.
A culpa pela evasão, claro, não é apenas da Unimed Paulistana. Embora ela tenha contribuído para esse cenário, a crise econômica é um fator com alcance mais horizontal e que atingiu não apenas as empresas do setor, mas também o bolso do consumidor.
INFLAÇÃO MÉDICA
O reajuste da mensalidade foi uma dessas ingratas notícias para o bolso do consumidor. Em 2015, a ANS aprovou um reajuste de até 13,55% para os chamados planos individual e familiar e impactou 17% dos beneficiados do país. O valor, claro, foi alvo de muitas críticas e resultou em reclamações e encerramentos de coberturas. Afinal, o percentual ficou acima da inflação e teve um acúmulo de 10,26% em 2015, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
A inflação medida pelo IBGE é um dos elementos que encarecem a mensalidade, mas há outros fatores. O cálculo é ainda mais complexo e considera também a Variação do Custo Médico e Hospitalar (VCMH), ou simplesmente “inflação médica”. Esse valor leva em consideração a própria inflação do país, o custo para a aquisição de variação cambial (afinal, há equipamentos e remédios são adquiridos fora do país, portanto em dólar).
Com a alta do dólar perante o real, os equipamentos e tratamentos praticamente subiram de preço “da noite para o dia” e o aumento foi repassado ao consumidor. Mas isso não atingiu apenas os planos sob o guarda-chuva da ANS. A mesma inflação médica também foi aplicada aos não regulados (como é o caso dos planos coletivos empresariais), que ainda tem como indicador decisivo a chamada taxa de sinistralidade (valor da indenização para cada R$ 1 recebido do beneficiário). “A taxa de sinistralidade é outro problema. Ela é ilegal, pois tira da operadora o elemento de risco de contrato. A essência do contrato de seguro é o risco. Para a operadora, o risco de receber pouco e ter que pagar muito”, critica Caio Domeneghetti, advogado e especialista em direito de saúde.
DESEMPREGO
Domeneghetti chama a atenção para o momento econômico do país e sua influência para os planos coletivos empresariais, que representam nada menos que 64% de total disponível no Brasil.
De uma maneira geral, benefícios não são submetidos às regras da ANS, mas os hábitos do próprio mercado. Assim, o reajuste de 13,55% não é válido para esse plano – e isso não é algo necessariamente positivo. “Tivemos casos de planos coletivos empresariais em que o reajuste chegou a 47%, um percentual abusivo para o consumidor. O salário do consumidor não chegou nem perto desse valor”, destacou Joana Cruz, advogada especializada em direito do consumidor do Idec.
Por outro lado, trata-se de um plano com valor mais acessível para a maior parcela da população, mesmo com todos os efeitos da inflação. No entanto, a crise econômica possui tentáculos ainda maiores e um deles é o desemprego.
Segundo dados do IBGE divulgados no último dia 15, o País registrou 8,6 milhões de desocupados no ano passado, uma alta de 27,4% em relação aos 6,7 milhões de 2014. Esses dados consideram apenas os empregos formais. Ou seja, sem trabalho, não há planos de saúde. Se você não foi afetado pelo desemprego, logo não há o que temer. Ou há? “Os problemas das seguradoras não têm nada a ver com o consumidor. Isso não impacta os direitos do consumidor”, afirma Domeneghetti.
CLÍNICAS POPULARES: SOLUÇÃO?
Diante dos problemas na saúde privada e os velhos problemas do Sistema Único de Saúde (SUS), há solução para a saúde? Um modelo que ganha força no país é a clínica popular.
Em linhas gerais, são serviços de média ou baixa complexidade e oferecidos a preços baixos. O serviço é atraente até para médicos, que são remunerados por valores acima da média oferecida pelos planos – algo em torno dos 40% do valor de uma consulta. No Brasil, já existem casos como o Dr. Consulta, a cearense Sim Clínicas, Minuto Med, entre outras.
Outro exemplo é a Clínica Fares. Há 28 anos no mercado e pioneira como clínica popular, a empresa adotou um sistema britânico de policlínica e realiza diagnóstico de saúde por meio de consulta e exames e possui até mesmo equipamentos de última geração.
O dono é Adiel Fares, filho do fundador da rede de móveis e eletrodomésticos Marabraz. O segredo? “Atendimento humanizado (do paciente ao médico), baixo custo (70% menor que o mercado), tecnologia (agendamento via internet e, em breve, por aplicativo) e uma administração que permite melhor remuneração aos médicos. Aqui, só não aceitamos planos de saúde. E já é assim há seis anos”, afirma Fares, que conclui: “Essas operadoras vão fechar em quatro anos. As clínicas populares serão o futuro”, profetiza.



